"Prefiro a beleza do que sinto,
Á face sórdida da realidade.
Á natureza ignóbil das coisas.

Prefiro o sonhar,
E que errem minhas mil quimeras!
A existência é um sonho pálido,
Nascido ao acaso.

O murmurinho dos pássaros,
Já tão mortos quanto eu.
E seus cadáveres esvoaçantes e graciosos.

A água límpida do rio;
Pacífica...
Onde a solidão escreve
Seus versos mais amenos.

Prefiro essa minha dor plácida.
Essa que repousa sempre no mesmo lugar:
Em meu peito.
À impureza daquilo que me cerca em silêncio."

 
"Escuta com atenção o que te digo,
Quando o homem com seu negro coração
Tira-nos o ânimo e magoa - meu amigo,
A natureza repõe com tamanha exatidão.

Ela cura. Protege-nos. É sua ordem natural.
Cuida dos que são seus frutos, não nos esquece.
Com mil ventos nos cerca, protege do mal
E com seus raios de Sol, nossa alma aquece.

Nada é maior nem mais forte do que ela,
Não se iluda com falsos deuses! Ela nos vela,
E sempre irá velar. Até nosso último momento.

Aquele em que enfim, nos uniremos
E para ela, já exaustos, retornaremos
Estaremo-nos então livres, de todo tormento."

 
"Em noite chuvosa,
A chuva suave... Abraça a terra.
E desse abraço faz nascer,
A brisa gélida que inunda a estação.

Nasce o perfume -
Uma mistura de sereno, frio e barro.
Nasce o mistério, o milagre,
Nasce a essência dos corações solitários.

Nesta noite minha alma é flor,
Que surge entre os espinhos...
É o veneno...
Floral, esquecido,
Lançado aos ventos frios memória."




 
Corpo sem alma a vagar pelas ruas,
Com o olhar cabisbaixo e hálito cadavérico,
Imo vazio, ressequido pelas mentiras cruas,
Espírito errante do poeta colérico.

Velho cadáver, já apodrecido,
Amolgando as amêndoas secas que jazem
Nas calçadas lodosas do outono esquecido,
Na noite soturna dos astros que morrem.

Traz no corpo a verdade sobre a tez pútrida,
Sua caveira é resposta, a verdade escondida.
Aquela que por toda história nunca foi revelada.

Sua essência sussurra o mistério amalgamado
Cantos funestos ao coração já cansado,
Canta pavorosamente:” E no fim... Não há nada!”

 
"Abraça-me amor, neste canto da eternidade.
Não nos ouvem lá de cima!
Com paixão e volúpia...
Abraça-me como sempre fizestes!

Nada são essas águas pútridas,
Esse rio ácido que nos submerge!
Nada são esses demônios,
Anjos negros que nos zombam e prostituem!

Abraça-me querido, como sempre fizestes...

Nessa vala escura e ácida,
Ecoam nossas respirações ofegantes,
Nossos algozes pungentes riem
Mas mal podem nos enxergar.

As pálpebras do dia pesaram-se,
Findou-se nosso tempo de sonhos.
E agora só temos um ao outro,
E este inferno asqueroso,
E todas as almas que nele padecem.

Mas abraça-me meu querido,
Por mais que doa, por mais que fira.
Abraça-me como sempre fizestes...
Temos agora um ao outro,
Nesse inferno sem fim!"




- Inspirado nos Círculos Infernais de Dante.