Deixe-me ser apenas nada,
Mais um objeto que parte faz
Dessa imagem emborrachada,
Que não se move e que dura jaz.

Olhe-me com o coração vazio,
De quem sem sentimento
Observa um quadro de tom frio
E desdenha-o sem arrependimento.

Sim! Rogo-lhe que ignore!
E sequer olhe-me como quem morre,
Apague de sua vista minha imagem.

Cruze meu caminho e vá embora,
E esqueça-se dessa vazia hora,
E nem sequer recorde de sua passagem!

 
"Perdoa-me pela demora
Atrasei-me e perdi a hora
Perdi-me nas veredas da vida
Nos degraus de minha descida.

Não sei se quer porque aqui estou
Se quiser que eu parta, diga, eu vou.
Não sei na verdade porque vim,
Não sei se por você, ou por mim.

Nesse tempo distanciei-me de mim,
Neguei-me e me feri por fim,
Fugi do amor e não quis me encontrar.

Sem saber que não é possível trair-se
Quando no escuro o que resta é despir-se
Chorar para então sorrir, partir -  para depois voltar."

 
"Escuta com atenção o que te digo,
Quando o homem com seu negro coração
Tira-nos o ânimo e magoa - meu amigo,
A natureza repõe com tamanha exatidão.

Ela cura. Protege-nos. É sua ordem natural.
Cuida dos que são seus frutos, não nos esquece.
Com mil ventos nos cerca, protege do mal
E com seus raios de Sol, nossa alma aquece.

Nada é maior nem mais forte do que ela,
Não se iluda com falsos deuses! Ela nos vela,
E sempre irá velar. Até nosso último momento.

Aquele em que enfim, nos uniremos
E para ela, já exaustos, retornaremos
Estaremo-nos então livres, de todo tormento."

 
Corpo sem alma a vagar pelas ruas,
Com o olhar cabisbaixo e hálito cadavérico,
Imo vazio, ressequido pelas mentiras cruas,
Espírito errante do poeta colérico.

Velho cadáver, já apodrecido,
Amolgando as amêndoas secas que jazem
Nas calçadas lodosas do outono esquecido,
Na noite soturna dos astros que morrem.

Traz no corpo a verdade sobre a tez pútrida,
Sua caveira é resposta, a verdade escondida.
Aquela que por toda história nunca foi revelada.

Sua essência sussurra o mistério amalgamado
Cantos funestos ao coração já cansado,
Canta pavorosamente:” E no fim... Não há nada!”

 
A tarde é minha fria amiga, nela as gotas de chuva deslizam finas,
Trazem ao peito a velha e enlanguescida dor.
E triste fico a observar teu espectro que some nas esquinas.
Rogo-te, imploro, “Não fujas, não fujas de mim, meu amor”.

Á noite meu leito é frio, uma cova rasa,
Pálida me deito, enterro-me junto ao meu pranto.
Com amargo saber que o teu, é lírio, é fogo, é brasa!
É amor, desejo e sorte, é vida, é encanto!

E se tento esquecê-lo em minha loucura,
Teu espectro vem com singular brandura,
E meu sonho lívido, algente, invade.

Caminhas como Rei, heróico e forte,
Não vês meu canto de langor e morte.
Não vês que o fito, em meu sonho, debalde.